quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Quando o amor faz mal

A novela Mulheres Apaixonadas, que atualmente a TV Globo reprisa no Vale a Pena Ver de Novo, mostra a história de Heloísa (Giulia Gam), uma mulher bem-sucedida que pára sua vida ao perder o controle do amor que sente pelo marido, Sérgio (Marcello Antony), e passa seus dias tentando retomar um casamento sufocado pelo ciúme e pela desconfiança. Para abandonar o “vício” no marido, Heloísa procura o grupo Mulheres que Amam Demais Anôminas (Mada), que dá apoio a mulheres que sofrem do mesmo mal. Foi justamente pela novela que a jornalista Marília Gabriela conheceu o Mada e foi lá que ela encontrou as personagens, desta vez bem reais, para seu livro Eu que Amo Tanto, recém-lançado pela editora Rocco.
Marília colheu o relato de 13 mulheres e depois interpretou as histórias delas.“Criei a imagem literária delas, mas fiz questão de manter a personalidade de cada uma”, conta a ÉPOCA. O livro ainda conta com as fotos do catalão Jordi Burch, amigo da escritora, que leu as histórias e traduziu em imagens os dramas dessas mulheres, usando elas mesmas como modelos, mas preservando sua identidade.
A jornalista convive com essas mulheres há quase um ano. As entrevistas foram feitas durantes os finais de semanas, na casa de Marília. Além disso, quando estava no Rio de Janeiro gravando suas cenas na novela Duas Caras, ela fazia questão de ligar para suas “entrevistadas”. “Perguntava para elas como estava a vida, deixava elas chorarem suas pitangas. Muito enxerida, dava meus palpites e pedia para que elas não desistissem de mim." Foi aí que nasceu a cumplicidade. “Foi muito confortável. Elas acharam até que o processo foi terapêutico”.
No livro, há a história de uma mulher que, depois de anos de casamento e com uma filha adolescente, decidiu trocar o marido por uma mulher. Acabou adquirindo um ciúme doentio da nova companheira, a ponto de lhe dar uma surra por desconfiar que ela matinha contato com uma ex. Em outro caso, uma mulher conta que chegou a ligar 78 vezes para o namorado em um único dia.

ÉPOCA - Por que você quis conhecer o universo das mulheres que amam demais?
Marília Gabriela -
O assunto amor sempre foi meu foco de interesse. Sempre. Sou fascinada mesmo. Há mais de vinte anos eu leio a respeito de amores e relações afetivas, sempre discuti o assunto com analistas para tentar entender o mecanismo entre homens e mulheres. Quando surgiu a oportunidade de trabalhar junto com o Jordi Burch, de fazer um livro com fotografias, logo pensei nas mulheres que amam demais. Por sua vez, o Jordi também sugeriu o tema amor.
ÉPOCA - Você é famosa, tem uma imagem de uma mulher forte, bem-sucedida. Isso ajudou na sua aproximação com essas mulheres?
Marília - Eu tenho uma técnica de entrevista que adquiri ao longe da carreira. Isso, claro, facilita na aproximação. Mas havia também o meu interesse franco e genuíno em ouvir o que essas mulheres falam. Porém, quando fui à primeira reunião, senti que elas se calaram. Teve uma que até saiu da sala. Percebi que era por minha causa e falei que não estava lá profissionalmente, pelo menos naquele momento, e que também era mulher, que tinha minhas mazelas e que gostaria muito de ficar e ouvir as histórias delas. Depois, disse para elas que havia ficado muito impressionada e que elas estavam passando realmente por um grande sofrimento. No final da reunião, propus que elas, uma por uma, fossem a minha casa, me contar a história delas e que eu ofereceria em troca daquele momento de horror, um momento de beleza que seria um livro baseado nas experiências dela, sem qualquer sombra de julgamento, e uma exposição de fotos feitas pelo Jordi Burch.
ÉPOCA - Você se identificou com alguma história?
Marília -
Claro. Existem as escolhas que passam, invariavelmente, pela infância e pela relação com os pais. Enquanto conversava com elas, percebi algumas coisas que passei pela vida e que não conseguia ver com muita clareza. Percebi também por onde passa o ciúme. Vi que tem momentos que a gente tem vontade mesmo de fazer um escândalo, expor certas situações, mas a gente não faz, mas elas optaram por fazer. Essas mulheres são como todas nós. Tem a jornalista, a auxiliar de limpeza, a modelo, a professora. São mulheres possíveis. A gente passa por elas todos os dias. Elas vivem esse drama, mas a gente não as ouve, não as vê. Queria que elas tivessem um momento de atenção.
ÉPOCA - Você conseguiu identificar quando o amor passa a ser uma patologia?
Marília -
Tenho a impressão de que a coisa avança para a patologia quando as mulheres sentem que perderam o controle do outro. Aí é que se dá o rompimento. Quando elas não conseguem ter a pessoa, ter no sentido total, de dominar, de saber onde está o tempo todo, o que a pessoa está fazendo,enfim, quando não conseguem dominar o amor do parceiro.

Jordi Burch

ÉPOCA - E isso é o que move a vida delas...
Marília -
Sim. Pura falta de auto-estima. É uma dependência do outro para existir. Elas só se enxergam em casal. Uma delas me perguntou: ‘você consegue ficar sozinha?’. Eu respondi ‘claro, e você também consegue!’. Quando você está bem, está acompanhada, mesmo sozinha. Você desenvolve trabalhos, projetos, aumenta sua auto-estima. E, aí sim, você se prepara para receber alguém na sua vida.
ÉPOCA - No livro, parece que algumas mulheres sentem um certo “orgulho” em amar demais...
Marília - Pode ser que uma ou outra sinta esse orgulho, mas elas sabem que isso é um equívoco. São mulheres que buscam a ajuda de um grupo de apoio para superar algo ruim, que elas mesmas se sentem incomodadas. Algumas levaram um susto ao pegarem o livro e verem a interpretação que eu dei para as histórias delas. Mas, no posfácio, escrevi que esperava que elas estendessem as cores com as quais eu pintei os relatos delas.
ÉPOCA - Você acha que os companheiros também são culpados ou colaboram para que essas mulheres tenham esse comportamento obsessivo?
Marília -
Sim. O problema é o casal. É muito fácil você desaparecer. Você colocar um ponto final no romance. Mas essas são histórias que duram muito tempo. Existe uma co-dependência aí. Tem casos no livro em que os homens arrumam outras mulheres, mas continuam na manutenção desses relacionamentos possessivos. Só que tem uma coisa: a mulher fala, se expõe, busca ajuda. Já os homens têm uma trava. Não falam de afetividade. Eu gostaria muito de, em um próximo trabalho, encarar esses homens que, ou amam demais, ou se permitem ser amados demais.
ÉPOCA - E você? É ciumenta?
Marília -
Eu já fui ciumenta em algumas situações. Mas, quando eu estou com uma pessoa bem resolvida, que me dá segurança, eu não sou. O ciúme vem de insegurança, da desconfiança. Eu tive casamentos com homens que foram muito honestos comigo. Foram relações bem resolvidas e por isso duraram muito tempo. Tive um ou outro namoro em que houve jogos de insegurança, que me geraram sentimentos péssimos, como o ciúme, que eu acho algo humilhante.
ÉPOCA - Você esteve segura mesmo quando foi casada com o Reynaldo Gianecchini, um dos homens mais desejados do Brasil?
Marília -
Sim, totalmente segura. O "Giane" foi de uma honestidade, de um amor tão claro e profundo...A gente se protegia tanto! Isso são palavras dele mesmo. Ele me diz que olha para trás e vê que a gente se protegia um ao outro. Com ele tive uma relação perfeita do início ao fim.

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