terça-feira, 19 de abril de 2011

Segunda chance

Nádia* casou-se cedo, aos 19 anos. Ela afirma que não sabia muito bem se o que estava fazendo era a escolha certa. Pedro*, seu noivo, parecia um ótimo partido, uma pessoa honesta, com boa índole e se dizia louco por ela. O casamento foi bastante simples, a noite de núpcias foi quase um desastre, mas a convivência nos quatro anos seguintes mostrou-se tranqüila para ambos até que Nádia, grávida, começou a desconfiar da fidelidade do marido, que saía constantemente à noite. Quando ameaçou dar um ultimato a Pedro, surpreendeu-se com uma agressão física. Após seis meses, ela pediu o divórcio.

Arrependido, ele reapareceu um ano depois, fazendo juras de amor e prometendo mudar seu comportamento. A mágoa já não tinha tanta força, ela não resistiu aos pedidos de Pedro. Resolveu perdoar e voltar para o ex-marido. "Pedro prometeu que dessa vez seria diferente e que me amava muito para viver longe de mim. Realmente, não tive mais conhecimento de possíveis traições e ele não encostou mais o dedo em mim com violência", revela Nádia.

Apesar de ter falhado na primeira, o casal voltou com mais vontade de ficar junto. "Aos poucos, o amor que sentia foi reacendendo e ficando até maior do que antes. Era como se tivéssemos acabado de nos conhecer, um recomeço de verdade. Depois de um tempo, ele me pediu em casamento outra vez e eu aceitei. Acreditava que ninguém mais poderia nos separar novamente", conta.

No entanto, nem tudo foram flores. Depois de mais cinco anos juntos, as brigas se tornaram cada vez mais freqüentes e Nádia resolveu, em 2003, largar o marido pela segunda vez. "Não agüentava a estupidez dele. Ele se mostrava uma coisa no início e depois agia de outra forma. Não respeitava a mim nem ao nosso filho, me agredia verbalmente e às vezes até fisicamente. Eu vi que estava me iludindo achando que ele mudaria, decidi que não permitiria mais ser enganada nem que eu enganasse a mim mesma", confessa ela, que mora há um ano com outro parceiro.

“Ele é o homem da minha vida. Jamais me perdoaria se tivesse deixado-o escapar mais uma vez. Acho que este tempo separado não destruiu nada do que a gente tinha e só serviu para crescermos e nos aprimorarmos”

A história de amor de Nádia e Pedro não teve um final feliz, mas é apenas uma entre muitas que poderiam ter dado certo, se o futuro atendesse às esperanças de casais que se dão uma segunda chance após uma separação. Assim como Nádia, a professora Adriana Fontes, de 29 anos, seguiu o coração e concedeu uma nova oportunidade para um ex-noivo, que hoje é seu marido. "Namorávamos desde 1999 e éramos muito apaixonados. Mas assim que ficamos noivos ele teve que mudar de estado a trabalho e não tinha condições de viajar com freqüência para me ver. Apesar de amá-lo, não resisti às saudades, à distância e ao ciúme, e chegamos à conclusão de que seria melhor dar um tempo", diz Adriana.

O noivo relutou de início, mas quatro meses depois de ir embora já estava saindo com outra pessoa. "Fiquei muito chateada quando soube, mesmo que a gente não estivesse mais junto. Ele sempre dizia que estava apenas tentando me esquecer, e que no fundo ainda me amava, mas meus amigos enchiam a minha cabeça contra ele. Só que, dentro de mim, eu sabia que ele estava sendo sincero e que eu também só queria ficar com ele", explica.

Adriana procurou sair com outras pessoas, mas a cabeça e o coração permaneciam na lembrança do ex. Quatro anos se passaram, ele pediu demissão do emprego e voltou à cidade de Adriana. Quando se reencontraram, tudo voltou a ser como antes: "Sentimos no olhar um do outro toda aquela paixão de novo. Não teve jeito. Reatamos e marcamos a data do casamento no ano seguinte", conta a professora. "Ele é o homem da minha vida. Jamais me perdoaria se tivesse deixado-o escapar mais uma vez. Acho que este tempo separado não destruiu nada do que a gente tinha e só serviu para crescermos e nos aprimorarmos", relata.

Íngrid*, de 48 anos, também tentou reviver uma relação que tinha acabado. Já divorciada, ela acreditava que tinha finalmente encontrado o amor de sua vida em outra pessoa, com a qual ficou casada por oito anos. "No início foi tudo perfeito. Eu estava totalmente apaixonada, achando que ele era o meu príncipe encantado. Porém, depois de uns três anos, começaram as dúvidas, brigas, telefonemas esquisitos. Isto acabou com a nossa relação", destaca Íngrid.

Ingrid apostou na mudança do amado e se arrependeu. "Ele é um homem muito sedutor e mulherengo. Da primeira vez que soube de sua pulada de cerca ainda não vivíamos juntos. Meu mundo caiu! Sabia que ele era assim, mas resolvi apostar na mudança, crendo que, por me amar, ele iria mudar. É óbvio que isto não aconteceu e nos separamos depois que soube que ele estava com uma outra mulher que morava perto de nós", afirma.

Íngrid acreditava que deixar o parceiro livre para viver aquela paixão seria mais inteligente de sua parte e pouparia um sofrimento maior. A separação ocorreu de forma tranqüila e o ex continuou ajudando-a nas despesas com o filho de seu primeiro casamento. Para se recompor, Íngrid voltou a estudar, sair com amigos e conhecer novas pessoas. "Senti o gosto da liberdade e adorei. Relacionei-me com vários homens, mas sem trazê-los para minha casa, para proteger meu filho. Mas não conheci ninguém nesta fase que superasse as qualidades do meu ex-marido", revela.

"Depois de três anos ele se separou. Nunca perdemos o contato e, por motivo de doença na família dele, nos reaproximamos mais rápido e intensamente. Aos finais de semana, passamos a sair à noite. Ele voltou a frequentar a minha casa e meu filho adorou". Depois de um ano, contudo, Íngrid levou um novo balde de água fria: "Recebi um telefonema da ex-mulher dele, dizendo que ele estava querendo voltar para ela. Nós nos encontramos, conversamos e eu cheguei à conclusão de que ele não tinha jeito mesmo. Saí de cena novamente. Porém, não da mesma maneira. Estou mais forte e acho que de certa forma já esperava isso", conclui Íngrid.

“O casal pode se gostar muito, mas não se dá conta do que é o conviver, de que ambos trazem facilidades e dificuldades que a vida lhes deu anteriormente, e muitas vezes tudo isso prejudica o avanço da relação”

Hoje, os dois continuam amigos e, apesar de descrente de relacionamentos amorosos, Íngrid se diz bastante amadurecida com o que passou. Tanto ela quanto Nádia acreditaram que um casamento poderia dar certo depois de já ter dado errado. Será que a decisão de se dar uma "segunda chance" a um parceiro não passa de persistência no erro? Ou será que relacionamentos podem ser "reciclados" e é possível reconquistar a felicidade depois de muito tempo ou de traições? Será que o amor de verdade resiste às separações e mágoas?

Fazendo certo

Para o psicólogo Paulo Bonança, a "segunda vez" pode, sim, ter um final feliz, principalmente porque o casal está mais maduro emocionalmente e já consegue perceber seus erros e acertos na primeira relação. "O rompimento é como um luto, em que os parceiros podem refletir sobre o que aconteceu durante o relacionamento. Este momento serve para que eles se perguntem qual a participação de cada um naquilo que não teve sucesso. Com isso, ocorre um crescimento, o casal 'se atualiza', o que até facilita a reaproximação, e pode até pensar: 'Peraí, temos tudo para dar certo'", observa Paulo, que afirma que é comum a pessoa tentar solucionar algo seu no outro.

Segundo ele, o relacionamento é um processo que envolve aspectos regressivos que podem pesar demais no desenvolvimento da relação: "Quando se inicia este processo, muitas coisas vêm inclusas, como fatores atuais, fatores do passado e espectativas para o futuro. O parceiro vai ter que lidar com reações da sociedade, com a família e com o passado do outro. O casal pode se gostar muito, mas não se dá conta do que é o conviver, de que ambos trazem facilidades e dificuldades que a vida lhes deu anteriormente, e muitas vezes tudo isso prejudica o avanço da relação", explica.

É fato que algumas pessoas, como Íngrid e Nádia, se magoam com determinadas atitudes dos parceiros e acabam dando uma nova oportunidade para a relação na esperança de que o outro mude seu comportamento ou até mesmo sua personalidade. "Nesse caso, é preciso se perguntar se gosta do parceiro do jeito que ele é, ou se gosta de como ele poderá ficar depois que mudar. Muitas vezes é esta pessoa que deseja a transformação do outro que precisa mudar seus padrões de felicidade e de escolha", ressalta o psicólogo.

Paulo Bonança destaca, ainda, que a chave para o sucesso de quem quer tentar novamente ser feliz com o ex (ou mesmo com um novo par) é sempre o diálogo: "Conversar é fundamental. Mas é preciso conversar de verdade. Muita gente se fala, mas não se comunica. Finge que sabe tudo do outro e que o outro sabe de tudo também, e fica por isso mesmo. Assim, assuntos sérios que devem ser abordados acabam virando tabus. O casal não pode ter medo de conversar sobre qualquer tema, principalmente quando o tema envolve os dois. E ter a ver com os dois é ter a ver com cada um", completa.

* Os nomes foram alterados a pedido dos entrevistados


Mônica Vitória


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