domingo, 13 de fevereiro de 2011

Diagnóstico para depressão

Hoje, a perda de um ente querido, um estresse no trabalho ou um relacionamento mal resolvido já são motivos para alguém achar que caiu em depressão. Especialistas alertam que, além de se tratar de uma disfunção muito mais séria do que a tristeza, a banalização do termo pode gerar erros no diagnóstico. "'Não sei por que me sinto tão mal' é uma frase recorrente entre pacientes deprimidos. Mas é preciso estar atento: outras doenças ou problemas de vida podem simular essa patologia. A pesquisa dos sintomas é a chave para a análise correta", diz o psiquiatra Antonio Egídio Nardi.

Exame de retina


Um estudo oferece novos contornos ao diagnóstico ainda complexo da depressão. Pesquisadores da Universidade de Freiburg, na Alemanha, concluíram que pessoas deprimidas enxergam o mundo em tons de cinza, literalmente falando. Por isso, o exame de retina, que analisa o contraste da visão, pode ser a ferramenta que faltava para um prontuário mais objetivo do que perguntar: como você está se sentindo?

A psiquiatra Juliana Kalaf do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, trata o assunto com ponderação: "É delicado diagnosticar um problema tão complexo como a depressão apenas por meio de um exame simplista. Os 'n' critérios da psiquiatria tradicional não podem ser deixados de lado. A análise ou psicoterapia é o mais importante de tudo. Remédios são imprescindíveis em alguns casos, mas não deixam de ser paliativos", contesta.

A redução do contraste, para o psiquiatra Miguel Chalub, do Hospital Universitário Pedro Ernesto, pode ter outras causas que não a depressão. "Este teste está em estágio experimental e ainda não é conclusivo. Falta ainda muita pesquisa para que possa ser considerado confiável e fidedigno", opina.

Antonio Egídio faz coro com os outros especialistas e reforça a importância do exame clínico: "Várias pesquisas procuram exames que possam ajudar no diagnóstico de depressão e de outros transtornos de humor, mas depois se mostram inconclusivos. Vamos torcer que este ajude a diagnosticar a disfunção. De qualquer forma, a entrevista psiquiátrica é e sempre será fundamental e insubstituível", reforça.

Herança genética

Outro fator importante a ser analisado é o histórico familiar, já que a depressão apresenta um componente genético. "Isso não quer dizer que é só a genética que vai contar, mas ela pode influenciar. Quem tem histórico na família, tem mais tendência a apresentar o distúrbio. Mas não é algo obrigatório. Tem gente que tem histórico e nunca apresenta a depressão. E tem gente que não tem e apresenta", explica Marco Antônio. "O que parece ser herdado é uma tendência para um funcionamento bioquímico anormal em algumas regiões cerebrais, o que facilitaria o desenvolvimento da doença", completa Egídio.

Os principais sintomas do distúrbio, continua o especialista, são o humor triste e a perda do interesse e do prazer, conhecida por anedonia. "Cansaço, alterações do apetite, distúrbios do sono, dores, sensação de desconforto, alterações nos movimentos, baixa autoestima, sentimentos de culpa, dificuldade de concentração, retraimento social, uso e abuso de drogas, problemas no trabalho, irritabilidade, distorção da realidade, ideação suicida e diminuição da libido também fazem parte do quadro", enumera.

É a intensidade e a durabilidade destes sentimentos que vão diferenciar a depressão da tristeza corriqueira. "Pessoas que sentem alguns desses sintomas constantemente, com intensidade suficiente para comprometer sua vida social e laborativa, devem procurar atendimento médico. Mas precisamos lembrar que outras doenças como anemia ou distúrbios da tireoide podem trazer sintomas similares. Já a tristeza é uma resposta natural a uma perda, desapontamento ou fracasso. Ela não compromete nosso raciocínio ou desempenho. Quando estamos tristes e recebemos uma boa notícia, melhoramos o nosso humor. Com o passar dos dias a tristeza vai diminuindo e só volta se lembramos do ocorrido, ao contrário da depressão", compara o psiquiatra Antônio Egídio Nardi.

O motivo desta confusão é, para o psiquiatra Marco Antônio, o fim do estigma. "Não há mais o preconceito de antes. Falar que você está deprimido é como falar que está com dor no ombro. Houve uma banalização do termo e a depressão virou sinônimo de tristeza. Mas é importante que as pessoas entendam que a depressão é muito grave. Não é uma tristeza transitória e sim um transtorno acompanhado por alterações não só psicológicas, mas biológicas", explica. Ele alerta: "A confusão de termos pode atrapalhar o diagnóstico. Isto porque o paciente já chega ao consultório autodiagnosticado. Cabe ao médico dizer qual a verdadeira situação e convencê-lo de que a tristeza não deve ser medicada".

A busca crescente por métodos que prometem curar sentimentos considerados negativos, como a tristeza, é uma característica da sociedade imediatista, segundo Juliana Kalaf. "Tem gente que fica triste e acha que está com depressão. São essas pessoas que procuram tratamentos ‘instantâneos'. Muitas vezes, elas não têm depressão, mas acabam seduzidas por promessas pomposas de diagnóstico e cura da doença que elas nem sequer apresentam, como se ficar triste não fizesse parte da vida", conclui.

O tratamento para depressão consiste na associação de medicamentos e psicoterapia. "O diálogo entre os dois é eficaz em 80% dos pacientes. Infelizmente, ainda não é possível saber qual o antidepressivo ideal para um determinado paciente antes que ele tome o medicamento. Do total de pacientes com um episódio depressivo, menos de 10% se tornarão crônicos (mais de dois anos de duração) apesar de todas as tentativas terapêuticas corretas", explica Egídio.

O psiquatra lembra: "Um paciente, após se recuperar inteiramente de uma fase depressiva, disse que nos dias mais negros de sua depressão achava que fosse morrer, e que o apoio e a convicção do médico em sua melhora foram fundamentais para manter uma pequena, mas decisiva, chama de esperança".

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